A prática de deixar ir
Se há coisas que te fazem sofrer, você tem que saber como deixá-las ir. Felicidade pode ser obtida soltando, deixando ir, incluindo deixando ir suas ideias sobre felicidade. Você imagina que certas condições são necessárias para sua felicidade, mas olhando profundamente se revelará para você que essas noções são exactamente as coisas que ficam no caminho da felicidade e te fazem sofrer.
Um dia o Buda estava sentado na floresta com alguns monges. Eles tinham acabado de almoçar e já iam começar um Compartilhamento sobre o Dharma quando um fazendeiro se aproximou deles. O fazendeiro disse: “Veneráveis monges, vocês viram minhas vacas por aqui? Eu tenho dezenas de vacas e elas fugiram. Além disso, eu tenho cinco acres de plantação de gergelim e este ano os insectos comeram tudo. Eu acho que vou me matar. Eu não posso continuar a viver assim”.
O Buda sentiu forte compaixão pelo fazendeiro. Ele disse: “Meu amigo, me desculpe, não vimos suas vacas vindo nessa direcção”. Quando o fazendeiro se foi, o Buda se voltou para seus monges e disse: “Meus amigos, sabem por que vocês são felizes? Porque vocês não têm vacas para perder”.
Eu gostaria de dizer a mesma coisa para vocês. Meus amigos, se vocês têm vacas, têm que identificá-las. Você pensa que elas são essenciais para sua felicidade, mas se você praticar olhar em profundidade, entenderá que são estas mesmas vacas que trazem sua infelicidade. O segredo da felicidade é ser capaz de deixar ir suas vacas, soltá-las. Você deveria chamar suas vacas por seus verdadeiros nomes.
Eu te garanto que quando você deixar suas vacas ir embora, você experimentará felicidade porque quanto mais liberdade você tem, mais felicidade você terá. O Buda nos ensinou que alegria e prazer são baseados na desistência, em deixar ir. “Eu estou deixando ir” é uma prática poderosa. Você é capaz de deixar as coisas irem? Se não for, seu sofrimento continuará.
Você deve ter a coragem de praticar o “deixar ir”, soltar. Você precisa desenvolver um novo hábito – o hábito de concretizar a liberdade. Você precisa identificar suas vacas. Você precisa considerá-las como um vínculo com a escravidão. Você precisa aprender como o Buda e seus monges fizeram, a libertar suas vacas. É a energia de plena atenção que te ajuda a identificar suas vacas e chamá-las por seus verdadeiros nomes.
Sorria, solte
Quando você tem uma ideia que te faz sofrer, deveria deixá-la ir, mesmo (ou talvez especialmente) se é uma ideia sobre sua própria felicidade. Cada pessoa e cada nação têm uma ideia de felicidade. Em alguns países, pessoas pensam que uma ideologia em particular deve ser seguida para trazer felicidade ao país e ao seu povo. Eles querem que todos aprovem a sua ideia de felicidade e acreditam que os que não estão a favor deveriam ser presos ou colocados em campos de concentração. É possível manter tal pensamento por cinquenta ou sessenta anos, e neste tempo criar uma tragédia enorme, apenas por causa desta ideia de felicidade.
Talvez você também seja prisioneiro de sua própria noção de felicidade. Há milhares de caminhos que levam à felicidade, mas você aceita somente um. Não considerou outros caminhos porque pensa que o seu é o único. Você seguiu este caminho com toda a sua força e, portanto os outros caminhos, os milhares de outros caminhos permaneceram fechados para você.
Deveríamos ser livres para experimentar a felicidade que apenas vem a nós sem ter que procurá-la. Se você é uma pessoa livre, a felicidade pode vir para você num estalo. Olhe para a lua. Ela viaja no céu completamente livre, e esta liberdade produz beleza e felicidade. Eu estou convencido que a felicidade não é possível a menos que seja baseada na liberdade. Se você é uma mulher livre, se você é um homem livre, desfrutará de felicidade. Mas se é um escravo, mesmo que apenas escravo de uma ideia, a felicidade será muito difícil de atingir. É por isso que você deveria cultivar a liberdade, incluindo a liberdade de seus próprios conceitos e ideias. Deixe suas ideias irem, mesmo que não seja fácil.
Conflitos e sofrimento são comumente causados por uma pessoa que não quer liberar seus conceitos e ideias sobre algo. Em uma relação entre pai e filho, por exemplo, ou entre parceiros, isto acontece o tempo todo. É importante treinar a si mesmo para deixar ir suas ideias sobre as coisas. Liberdade é cultivada pela prática de deixar ir. Se você olhar profundamente, poderá ver que está se segurando a um conceito que está te fazendo sofrer um bocado. Você é inteligente o suficiente, você é livre o suficiente para desistir dessa ideia?
Estou me tornando calmo
Estou deixando ir
Tendo deixado ir, a vitória é minha
Eu sorrio
Eu sou livre
O Dharma que o Buda apresentou é radical. Contém medidas radicais para cura, para transformação da situação actual As pessoas se tornam monges e monjas porque entendem que a liberdade é preciosa. O Buda não precisava de uma conta no banco ou uma casa. No tempo dele, as posses de um monge ou monja eram limitadas aos robes que vestiam e uma tigela para colectar comida. Liberdade é muito importante. Você não deveria sacrificar ela por nada, porque sem liberdade não há felicidade.
(Do livro “You are here”, de Thich Nhat Hanh)
(Tradução para o português: leonardo Dobbin)
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